Por Marcie Grynblat Pellicano |
Até a humanidade inventar a escrita, as aventuras dos viajantes só podiam ser contadas oralmente para os “ficantes”. Com a escrita, entretanto (obrigada, fenícios!), a coisa melhorou muito, pois os relatos passaram a ganhar registro. E com Gutemberg, então, o business conheceu um boom sem precedentes: de fato, os tipos móveis foram uma invenção tão inovadora que foram necessários seis séculos para desbancá-la.
E com isso chegamos à era digital, à internet, aos blogs de viagem e, mais especificamente, ao meu post para a ABBV. Um post que, como a introdução já deixa adivinhar, vai falar um pouco de… livros de viagem. Sei que mais de uma pessoa (ou muitas pessoas) já falaram disso, mas é que tenho uma teoria: quanto mais falamos de livros, mais o horizonte se alarga. Sei que frequentemente existem sobreposições: quer dizer, recomendar uma obra que já foi mais do que citada. Acontece. Mas prefiro pecar pelo excesso do que pela moderação.
Mas sem exagerar também. Podemos bem imaginar a quantidade colossal de livros de viagem que já se escreveu de Homero para cá. Ou de Marco Polo para cá… Milhares e milhares e milhares. Quais pinçar, portanto? Os clássicos? Mas os clássicos todo mundo conhece! Os menos clássicos? Mas aí podemos deixar obras importantes de fora… Enfim, não é fácil.
A saída? Falar dos livros de viagem aos quais cheguei naturalmente ao longo da vida. Sem cronologia nem ordem de preferência. Minha experiência pessoal. Começando com uma pequena jóia: o sensível Marinheiro de Primeira Viagem, de Osman Lins. Li-o numa edição (do maridão) de 1980. Emocionante. De Osman Lins, salto para Hans Christian Andersen, que li ainda na juventude. Não O Patinho Feio ou A Pequena Sereia (que é claro li bem mais cedo…) mas seus relatos de viagem pela Europa. Em inglês, a edição tem o nome genérico de Travels. Sei que ele escreveu também sobre uma viagem a Portugal, mas infelizmente não tenho esse.
De Hans Christian podemos saltar para Goethe: Viagem à Itália. E já que estamos na Itália, incluiria também o livro de Montaigne, que fez basicamente o mesmo roteiro. É clásico demais? Oqui doqui, vamos dar um salto no tempo: Na Patagônia, do Bruce Chatwin (que teria sido um blogueiro extraordinário, não tivesse a AIDS ceifado sua vida quando a internet ainda engatinhava). De Chatwin para Paul Theroux, que continua desovando grandes títulos. Minha recomendação: The Great Railway Bazaar.
Enfim, a lista é longa. Mais longa ainda se acrescentarmos os travel books que, embora repletos de informações, entram na categoria fiction: On The Road, de Jack Kerouac; The Sheltering Sky, de Paul Bowles; Out of Africa, de Isak Dinesen (na verdade, Karen Blixen, cuja casa, na Dinamarca, virou um maravilhoso museu); A Passage to India, de E. M. Forster; etc, etc.
E, sem me alongar, vou fechar o post com Julio Verne, mas não o Verne de A Volta ao Mundo em 80 Dias. E, sim, o de Kéraban the Inflexible, uma viagem deliciosa – sabem onde? – em Istambul! Só vou contar o comecinho: Kéraban precisa cruzar o Estreito de Bósforo no dia em que o governo cria um pedágio para a travessia. Ele se recusa a pagar a taxa e decide dar a volta no perímetro do Mar Negro: uma viagem de quase 4 mil quilômetros para não pagar um pedágio de alguns reais… Como se diz hoje, é hilário. Sem deixar nunca de ser um travel book.
Espero que minha modesta lista seja de ajuda aos blogueiros interessados em aperfeiçoar sua atividade. Olhar pra trás é fundamental: são mais de dois mil anos de relatos de viagem. Num arco de tempo desses, os blogs parecem bebezinhos que mal aprenderam a falar. Que dirá escrever…
Foto: Marcie Grynblat Pellicano
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Marcie Grynblat Pellicano é publicitária e mora há 10 anos em Nova York, onde tem uma empresa de eventos. Desde 2009 escreve o blog Abrindo o Bico, especializado na Big Apple.
Respostas de 11
Excelente texto! Vou acrescentar alguns desses à minha lista! Gosto bastante de livros que a viagem apenas faz parte do enredo, mas o envolvimento fica tão grande que no final aquilo é quase um roteiro…
Para quem estuda/ gosta de arquitetura deixo aqui a indicação de um que vou começar a ler: A viagem do Oriente, de Le corbusier. São os relatos inspirados de um jovem que se tornou um dos grandes nomes da arquitetura mundial.
Abraço!
Gosto tanto de livros de viagem! Muitas vezes as viagens só são realizadas dentro deles, outras por conta deles… e são tantos. O preferido Cidades Invisíveis (Italo Calvino), marcante A Morte em Veneza (Thomas Mann) e A viagem (Virginia Woolf). Comprei no aeroporto A arte de viajar de Alain de Botton e estou adorando! Já vou anotar as suas dicas, pois destes só li Kerouac. Abs
Marcie, esse do Kéraban é sensacional! Já fiquei com vontade!
Bjos.
Adoro ler, e às vezes é a única forma que tenho pra viajar quando nosso planning não permite que nossas escapadas se concretizem. Kundera me transportou pra região da Boêmia antes da invasão soviética em “A insustentável leveza do ser”, e a cada linha de Victor Hugo descrevendo a Notre Dame de Paris tenho vontade de ir verificar tudo na catedral. Ja vou incluir as dicas na minha listinha!
Adorei o texto! Um enfoque leve e gostoso de ler sobre o assunto. Já coloquei os que faltam na minha lista 🙂 Bjs!
Nívia, também li A arte de viajar de Alain de Botton. Vai nessa mesma linha de falar dos lugares a partir da arte e literatura. Também é um bom livro, principalmente do meio para o fim. No início demorei a captar a ideia…
No final, achei ótimo o capítulo que se baseia nas experiências de John Ruskin. Foi daí que parti para o livro As pedras de Veneza, de Ruskin… uma preciosidade para quem aprecia a arte e arquitetura da sereníssima!
(Marcie, me empolguei com seu post) Você tem mais alguma informação sobre o livro travels, de Hans Christian Andersen?
Abraço
Peter, este livro está a venda na Amazon (onde, eu garanto, eu não ganho nenhuma comissão, haha!). http://www.amazon.com/Travels-Green-Integer-Christian-Andersen/dp/1557133441/ref=sr_1_2?ie=UTF8&qid=1353500072&sr=8-2&keywords=Travels+by+Hans+Christian+Andersen
Parece Carola, mas o livro mais vendido do mundo a Bíblia é o relato das andanças e passagens de Jesus pela terra Sagrada.
Antes disto no velho testamento a fuga do Egito é um relato de uma grande viagem.
Desde sempre o homem anda e relata suas viagens e passagens pelo mundo, os blogs são somente um apêndice moderno destas aventuras.
Parabéns Marcie
Adorei, Marcie!
Adoro os antigos livros de viagem e, especialmente, como eles abordam muitas vezes uma questão filosófica de se pensar e questionar o mundo, numa época em que viagens eram relatadas mais como testemunhos da descoberta de uma terra ou lugar desconhecido do que essa coisa “moderna” de dica de um próximo lugar para passar as férias.
Atualmente gosto de ambos, mas num livro sobre viagens, cujos horizontes, como você falou, se alargam na mesma proporção das idéias, dá para esmiuçar, debater e, literalmente, viajar nesses aspectos que permeiam viagens e vida.
Adorei o texto e fico feliz que eu tô na mesma linha – atualmente apaixonada por Paul Theroux, Alain de Botton e outros acima citados.
Delícia de texto, boas referências da Marcie e dos comentaristas. Mais uma? Teoria da Viagem, poética da geografia, do Michel Onfray. É, como diz na orelha, um inventário de reflexões andarilhas. Um livrinho que a gente acha que vai ler numa sentada e nunca mais desgruda dele. Abraços
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